Tributação de criptomoedas no Brasil: possibilidades e impedimentos

Tributação de criptomoedas

Na aula anterior do curso Direito das Criptomoedas, vimos como a legislação vigente no Brasil pode ser aplicada a negócios jurídicos realizados com o uso de moedas virtuais.

A partir desta aula, vamos analisar como as criptomoedas podem (ou não) ser tributadas.

A princípio, poder-se-ia pensar na tributação de transações realizadas com criptomoedas à semelhança das taxações de operações de câmbio previstas na Lei 1.807, de 7 de janeiro de 1953.

No entanto, como não há equiparação legal a moedas estrangeiras, não se pode exigir tributo a partir da referida lei, devido ao princípio da legalidade estrita do Direito Tributário, consagrado no artigo 150, inciso I, da Constituição Federal.

A analogia também afrontaria o artigo 108, § 1º, da Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional), que dispõe que “o emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei”.

Atualmente, e somente para fins tributários, a Secretaria da Receita Federal do Brasil equipara as criptomoedas não a uma moeda estrangeira, mas a um ativo financeiro, um bem jurídico com valor de mercado, assim como antiguidades ou obras de arte, nos termos do artigo 25, § 1o, inciso II, da Lei 9.250, de 26 de dezembro de 1995.

No Brasil, o Conselho Federal de Contabilidade criou, por meio da Resolução 1.055, de 7 de outubro de 2005, o Comitê de Pronunciamentos Contábeis, que tem como objetivo, segundo o artigo 3º da referida resolução1,

o estudo, o preparo e a emissão de Pronunciamentos Técnicos sobre procedimentos de Contabilidade e a divulgação de informações dessa natureza, para permitir a emissão de normas pela entidade reguladora brasileira, visando à centralização e uniformização do seu processo de produção, levando sempre em conta a convergência da Contabilidade Brasileira aos padrões internacionais.

O Comitê de Pronunciamentos Contábeis publicou, em 14 de novembro de 2008, a Deliberação 553, de 12 de novembro de 2008, que trata de ativos intangíveis. Segundo o item 12 desta Deliberação2,

Um ativo satisfaz o critério de identificação, em termos de definição de um ativo intangível, quando:

(a) for separável, ou seja, puder ser separado da entidade e vendido, transferido, licenciado, alugado ou trocado, individualmente ou junto com um contrato, ativo ou passivo relacionado, independente da intenção de uso pela entidade; ou

(b) resultar de direitos contratuais ou outros direitos legais, independentemente de tais direitos serem transferíveis ou separáveis da entidade ou de outros direitos e obrigações. 

Nos termos da Deliberação, as criptomoedas podem ser classificadas, para fins contábeis, como um ativo intangível.

O Decreto 9.580, de 22 de novembro de 2018, que “Regulamenta a tributação, a fiscalização, a arrecadação e a administração do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza”, popularmente conhecido como Regulamento do Imposto de Renda, dispõe em seus artigos 33 e 34:

Art. 33. Constituem rendimento bruto todo o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos, os alimentos e as pensões percebidos em dinheiro, os proventos de qualquer natureza e os acréscimos patrimoniais não correspondentes aos rendimentos declarados (Lei nº 5.172, de 1966 – Código Tributário Nacional, art. 43, caput , incisos I e II ; e Lei nº 7.713, de 1988, art. 3º, § 1º).

Art. 34. A tributação independe da denominação dos rendimentos, dos títulos ou dos direitos, da localização, da condição jurídica ou da nacionalidade da fonte, da origem dos bens produtores da renda e da forma de percepção das rendas ou dos proventos, sendo suficiente, para a incidência do imposto sobre a renda, o benefício do contribuinte por qualquer forma e a qualquer título (Lei nº 5.172, de 1966 – Código Tributário Nacional, art. 43, § 1º; e Lei nº 7.713, de 1988, art. 3º, § 4º).

Parágrafo único. Sem prejuízo do ajuste anual, se for o caso, os rendimentos serão tributados no mês em que forem recebidos, considerado como tal aquele da entrega de recursos pela fonte pagadora, inclusive por meio de depósito em instituição financeira em favor do beneficiário (Lei nº 7.713, de 1988, art. 2º; e Lei nº 8.134, de 1990, art. 2º ao art. 4º).

Já em maio de 2019, a Receita Federal publicou a Instrução Normativa 1.888/2019, que “institui e disciplina a obrigatoriedade de prestação de informações relativas às operações realizadas com criptoativos à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil”. Por essa regra, as exchanges ficam obrigadas a fornecer mensalmente para a Receita informações detalhadas de cada transação realizada, por cada cliente.

A partir dessas definições, veremos nas próximas aulas as hipóteses de incidência dos seguintes tributos sobre operações com criptomoedas:

  • Imposto de Renda
  • ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços)
  • ITCD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação)
  • ISS (Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza)

Vamos começar analisando o Imposto de Renda, tema da nossa próxima aula. Espero você lá!

Notas

  1. CONSELHO FEDERAL DE CONTABILIDADE. Resolução CFC 1.055, de 7 de outubro de 2005. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 24 out. 2005. Disponível em: http://www.portaldecontabilidade.com.br/legislacao/cfc1055.htm. Acesso em: 19 out. 2016.
  2. COMITÊ DE PRONUNCIAMENTOS CONTÁBEIS. Deliberação 553, de 12 de novembro de 2008. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 14 nov. 2008. Disponível em: http://www.normaslegais.com.br/legislacao/deliberacaocvm553_2008.htm. Acesso em: 19 out. 2016.
Escrito por
Walmar Andrade
Walmar Andrade