Aplicação da legislação aos negócios jurídicos com criptomoedas

Legislação Bitcoin

Para começar o estudo da aplicação da legislação vigente ao uso das criptomoedas, vamos primeiro analisar nesta aula do curso Direito das Criptomoedas como algumas leis se aplicam aos negócios jurídicos realizados com moedas virtuais no Brasil.

No segundo módulo do curso, a análise das estatísticas de uso das criptomoedas no Brasil e no mundo deixou claro que cada vez mais veremos negócios jurídicos sendo realizados com esse novo instrumento.

Com o crescimento das criptomoedas sobre as moedas nacionais, é provável que o Estado queira, de alguma forma, controlar o que foi idealizado para não ser controlado. 

Conforme vimos no módulo três, simplesmente considerar nulos os contratos realizados com criptomoedas, como preveem interpretações do Decreto-lei 857 e da Lei 10.192, não parece ser a maneira mais eficaz de enfrentar o problema do ponto de vista jurídico. 

A mera proibição também deve encontrar dificuldades, pois a história mostra que as tentativas de se barrar redes descentralizadas de troca de arquivos digitais têm se mostrado custosas e pouco efetivas.

Nos termos do Código Civil (Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002), e considerando a natureza jurídica das criptomoedas como bens jurídicos intangíveis, uma aquisição de bem com criptomoedas não pode ser considerado contrato de compra e venda, mas sim contrato de permuta

O artigo 481 do Código dispõe que “pelo contrato de compra e venda, um dos contratantes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em dinheiro” (grifo nosso). 

Como a moeda virtual não é legalmente considerada dinheiro, o contrato, se não for considerado nulo, seria melhor classificado nos termos do artigo 533 do Código Civil como contrato de permuta.

Segundo Gonçalves (2013, p. 271)1, o contrato de permuta é bilateral, oneroso, consensual e comutativo, por meio do qual “as partes se obrigam a prestar uma coisa por outra, excluindo o dinheiro”.

Já uma aquisição de criptomoedas com moeda nacional, como uma compra de Bitcoins com reais em uma casa de câmbio, é classificada como contrato de compra e venda, de acordo com o disposto no citado artigo 481 do Código Civil. 

Gonçalves (2013, p. 214) ensina que bens incorpóreos podem ser objeto de contrato de compra e venda, tecnicamente chamado de cessão.

Todos os elementos obrigatórios (coisa, preço e consentimento) e todas as características (bilateralidade ou sinalagmatismo, consensualidade, onerosidade e comutatividade) do contrato de compra e venda estão presentes na compra de criptomoedas com dinheiro nacional.

O maior desafio para o Direito é a emissão originária das criptomoedas, como é exemplo o caso da mineração do Bitcoin.

Neste caso, o indivíduo gera um bem jurídico incorpóreo a partir de esforços e investimentos. Por se tratar de situação inédita, não há paralelo no Código Civil para o caso específico.

No entanto, o bem gerado poderá ser tributado, conforme veremos a partir da próxima aula do curso.

Notas

  1. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 3: Contratos e Atos Unilaterais, 10.ed., São Paulo: Saraiva, 2013.
Escrito por
Walmar Andrade
Walmar Andrade