A invenção do Bitcoin em 2008 por Satoshi Nakamoto

Invenção do Bitcoin

Na aula anterior do curso Direito das Criptomoedas, vimos que as ideias para criação de uma moeda digital, independente de governos e que funcionasse à margem do Direito tradicional já vinham desde o início da década de 1990.

Mas essas primeiras ideias não conseguiam resolver matematicamente e tecnologicamente o problema do gasto duplo.

Quando uma pessoa envia para outra um arquivo digital, as duas passam a ter uma cópia desse arquivo. Pense em quando você envia um email com um anexo para alguém. Agora tanto o remetente quanto o destinatário possuem uma cópia desse arquivo.

Isso não poderia acontecer com uma moeda digital. E todos os envolvidos na criação de uma moeda digital quebravam a cabeça para resolver esse problema.

Até que um dia, mais precisamente em 31 de outubro de 2008, apareceu uma solução. Um email assinado por um tal de Satoshi Nakamoto foi enviado para a lista de discussão The Cryptography Mailing List, com o seguinte artigo:

https://walmarandrade.com.br/wp-content/uploads/2021/02/bitcoin_pt.pdf

Em apenas 9 páginas, de maneira efetiva e elegante, o tal do Satoshi Nakamoto solucionava o problema do gasto duplo e criava as bases para uma moeda digital de código aberto, criptografada, descentralizada e segura.

Surge o Bitcoin

No artigo, que visava contribuir para o debate já travado na lista de discussão, Nakamoto descreve detalhadamente um protocolo de código aberto, criptografado, matematicamente válido, sem fronteiras, independente de qualquer autoridade central e que utiliza um banco de dados distribuído entre todos os usuários do sistema para emitir e controlar uma moeda virtual de gasto duplo impossível, então batizada de Bitcoin.

Em síntese, o Bitcoin é a união da criptografia com a distribuição de um banco de dados por meio de uma rede peer-to-peer, ou seja, uma arquitetura de rede na qual cada computador funciona tanto como cliente quanto como servidor, permitindo compartilhamentos de dados criptografados sem a necessidade de um servidor central. A criptografia e as redes peer-to-peer vêm sendo desenvolvidas por mais de 40 anos (ANDRESSEN, 2014)1.

As características essenciais de uma moeda tradicional estão presentes no Bitcoin, com as vantagens de ser virtual e sem fronteiras. O Bitcoin é:

A principal inovação do Bitcoin, como dissemos, foi resolver o problema do gasto duplo, eliminando a necessidade de um terceiro intermediário de confiança para se concluir uma transação.

No artigo que idealizou a moeda virtual, este é o primeiro problema abordado por Nakamoto:

Nós definimos uma moeda eletrônica como uma cadeia de assinaturas digitais.

Cada proprietário transfere a moeda para o próximo assinando digitalmente uma codificação com as transações anteriores e a chave pública do próximo proprietário e adicionando estas ao fim da moeda.

Um recebedor pode verificar as assinaturas para verificar a cadeia de propriedade.

O problema obviamente é que o recebedor não pode verificar se um dos proprietários anteriores não gastou duplamente a moeda.

Uma solução é introduzir uma autoridade central confiável, ou emissor, que verificaria cada transação contra o gasto duplo. A cada transação, a moeda seria retornada ao emissor, que emitiria então uma nova moeda, e apenas as moedas emitidas diretamente do emissor seriam confiáveis de não terem sido gastas duas vezes.

O problema com esta solução é que todo o sistema monetário dependeria da empresa rodando o emissor, e cada transação teria que passar por ele, exatamente como um banco.

Nós precisamos de uma forma de o recebedor saber que os donos anteriores não assinaram nenhuma nova transação.

Para este propósito, a transação mais antiga é a transação que conta, então nós não nos importamos sobre novas tentativas de gasto duplicado.

A única forma de confirmar a validade de uma transação é estar ciente de todas as transações.

Em um modelo baseado no emissor, o emissor está ciente de todas as transações e sabe qual delas chegou primeiro.

Para atingir o objetivo sem um intermediário confiável, as transações precisam ser publicamente anunciadas e nós precisamos de um sistema em que os participantes concordem em um único histórico da ordem em que elas foram recebidas.

O recebedor precisa provar que no tempo de cada transação, a maioria dos nós concordou que ele foi o primeiro a receber.

(NAKAMOTO, 2008, p. 2)2

De acordo com a solução proposta por Nakamoto, em vez de o registro histórico de débitos e créditos ser controlado por uma instituição centralizada, ele passou a ser acessível a todos os usuários do sistema, por meio de uma rede peer-to-peer.

Em uma das respostas na lista de discussão onde o Bitcoin nasceu, Nakamoto (2008) lembra que “governos são bons em cortar a cabeça de redes centralmente controladas, como o Napster, mas redes puramente peer-to-peer, como Gnutella e Tor, parecem seguir em frente inabaladas”.

Essa inovação que é a base do Bitcoin foi chamada de Blockchain. Ela é tão revolucionária que dedicaremos a próxima aula do curso Direito das Criptomoedas exclusivamente para estudá-la. Até lá!

Notas

  1. ANDRESSEN, Marc. Why Bitcoin Matters, 22 jan. 2014. Disponível em: http://blog.pmarca.com/2014/01/22/why-bitcoin-matters/. Acesso em: 19 set. 2016.
  2. NAKAMOTO, Satoshi. Bitcoin: um sistema de dinheiro eletrônico ponto-a-ponto, 2008. Disponível em: https://bitcoin.org/files/bitcoin-paper/bitcoin_pt.pdf. Acesso em: 19 fev. 2021.
Escrito por
Walmar Andrade
Walmar Andrade