Sempre que o assunto é a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), surge a dúvida sobre o que é a ANPD, sigla que aparece mais de vinte vezes no corpo do texto legal.
A resposta para a pergunta o que é a ANPD é relativamente simples. Trata-se da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, órgão responsável por fiscalizar e regulamentar a aplicação da LGPD.
Desde sua criação, a ANPD tem desempenhado um papel essencial na supervisão do tratamento de dados pessoais, na imposição de sanções e na elaboração de diretrizes para a adequação à LGPD.
Além disso, atua na mediação de conflitos entre titulares de dados e empresas, promovendo maior transparência e segurança jurídica no uso das informações pessoais.
Neste artigo, vamos explorar o que é a ANPD, sua estrutura e suas competências, conforme estabelecido nos arts. 55 a 57 da LGPD. Também abordaremos seu impacto na proteção de dados no Brasil e as discussões sobre sua autonomia administrativa.
Veremos em detalhes:
Comecemos pelo básico, analisando o que é a ANPD exatamente.
O que é a ANPD?
A Autoridade Nacional de Proteção de Dados é o órgão responsável por zelar pela aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) no Brasil.
Desde 2022, com a promulgação da Lei 14.460, a ANPD passou a ser uma autarquia de natureza especial, dotada de autonomia técnica e decisória, com patrimônio próprio e com sede e foro no Distrito Federal.
Antes, ela era entidade da administração pública federal vinculada diretamente à Presidência da República.
A mudança aproximou a natureza jurídica da ANPD daquelas já aplicadas a outras agências reguladoras, como Anatel, Aneel e Antaq.
A importância da ANPD reside em seu papel de garantir o equilíbrio entre o uso responsável de dados pessoais e a proteção dos direitos dos cidadãos, promovendo maior segurança jurídica para empresas e titulares de dados.
Para isso, a LGPD atribuiu à Autoridade uma estrutura própria e uma série de competências.
A estrutura da ANPD
A estrutura da ANPD está prevista no art. 55-C da LGPD e é composta por diferentes órgãos que desempenham funções administrativas, consultivas e fiscalizatórias.
Essa organização visa garantir que a ANPD exerça suas competências de maneira eficiente e transparente.
A estrutura da ANPD é composta pelos seguintes órgãos:
- Conselho Diretor: É o órgão máximo da ANPD, responsável pela tomada de decisões estratégicas, edição de normas e regulamentos e aplicação das sanções previstas na LGPD. Seus membros são indicados pelo Presidente da República e têm mandatos definidos.
- Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade: Tem caráter consultivo e é formado por representantes do setor público, privado e da sociedade civil. Sua função é auxiliar na formulação de diretrizes para a Política Nacional de Proteção de Dados Pessoais e Privacidade.
- Corregedoria: Atua na fiscalização interna da ANPD, apurando eventuais irregularidades cometidas por seus membros e assegurando a integridade da instituição.
- Ouvidoria: Responsável por receber e processar reclamações e sugestões relacionadas ao funcionamento da ANPD, garantindo transparência e participação social.
- Procuradoria: Oferece suporte legal e jurídico às decisões da ANPD, garantindo que suas ações estejam em conformidade com o ordenamento jurídico brasileiro.
- Unidades administrativas: Responsáveis pelo funcionamento operacional da ANPD, dando suporte técnico e logístico para a execução de suas atividades.
Vejamos em maiores detalhes o funcionamento do Conselho Diretor.
Conselho Diretor da ANPD
Os arts. 55-D a 55-F da LGPD estabelecem regras sobre a composição, nomeação, mandato e destituição dos membros do Conselho Diretor da ANPD.
O Conselho Diretor é composto por cinco diretores, incluindo o Diretor-Presidente, todos escolhidos pelo Presidente da República e aprovados pelo Senado Federal.
Os membros devem ser brasileiros com reputação ilibada e notório conhecimento na área. O mandato é de quatro anos, mas os primeiros nomeados terão prazos escalonados de dois a seis anos.
Os diretores só podem perder o cargo por renúncia, condenação judicial definitiva ou processo administrativo disciplinar..
Após deixarem o cargo, os diretores devem seguir as restrições da Lei nº 12.813/2013, que trata de conflitos de interesse no setor público. Assim, eles precisam cumprir uma “quarentena” de seis meses antes de voltar ao mercado. O descumprimento dessas regras configura ato de improbidade administrativa.
Primeiros diretores da ANPD
Em 5 de novembro de 2020, a Presidência da República publicou cinco decretos nomeando os cinco primeiros diretores da ANPD:
- Waldemar Gonçalves Ortunho Júnior: com mandato de seis anos, foi escolhido como primeiro Diretor-Presidente da ANPD.
- Arthur Pereira Sabbat: nomeado para mandato de cinco anos.
- Joacil Basilio Rael: nomeado para mandato de quatro anos. Ficou no cargo até novembro de 2024. Em seu lugar, foi nomeado Iagê Zendron Miola, com mandato de quatro anos até dezembro de 2028.
- Nairane Farias Rabelo Leitão: nomeada para mandato de três anos. Ficou no cargo até novembro de 2023.
- Miriam Wimmer: nomeada inicialmente para mandato de dois anos, foi depois reconduzida para um mandato de quatro anos.
As 24 competências da ANPD
O art. 55-J da LGPD define 24 competências da ANPD. Abaixo, cada uma delas é detalhada:
- Zelar pela proteção dos dados pessoais – A ANPD deve garantir que a LGPD seja cumprida e que os direitos dos titulares sejam respeitados.
- Zelar pela observância dos segredos comercial e industrial – A ANPD deve observar a proteção de dados pessoais e do sigilo das informações quando protegido por lei ou quando a quebra do sigilo violar os 7 fundamentos da LGPD.
- Elaborar diretrizes para a Política Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade – Criar e estabelecer princípios que guiem a proteção de dados no Brasil.
- Fiscalizar e aplicar sanções – Supervisionar o cumprimento da lei e aplicar as 9 sanções administrativas da LGPD, garantindo o direito ao contraditório e à ampla defesa.
- Apreciar reclamações de titulares contra controladores – Intervir quando titulares de dados não conseguirem solucionar problemas diretamente com as empresas.
- Promover conhecimento sobre proteção de dados – Realizar campanhas educativas para a população entender seus direitos e deveres.
- Realizar estudos sobre práticas nacionais e internacionais – Analisar tendências globais para aprimorar a regulamentação no Brasil.
- Estimular padrões para controle dos titulares sobre seus dados – Incentivar boas práticas para que os titulares possam gerenciar seus próprios dados de forma facilitada.
- Cooperar com autoridades de outros países – Trabalhar com órgãos internacionais para alinhar normas de proteção de dados.
- Definir regras para publicidade das operações de tratamento de dados – Estabelecer critérios para a transparência das atividades de processamento de dados pessoais.
- Solicitar informações sobre o tratamento de dados pelo setor público – Exigir que órgãos públicos forneçam detalhes sobre o uso de dados pessoais.
- Elaborar relatórios anuais de gestão – Produzir documentos que detalham as ações da ANPD ao longo do ano.
- Regulamentar normas sobre proteção de dados e relatórios de impacto – Criar regras para minimizar riscos no tratamento de dados pessoais.
- Ouvir a sociedade e os agentes de tratamento – Realizar consultas públicas e coletar sugestões sobre regulamentação.
- Gerir suas receitas e publicar relatório financeiro – Administrar seu orçamento de forma transparente.
- Realizar auditorias sobre o tratamento de dados – Inspecionar empresas e órgãos públicos para verificar o cumprimento da LGPD.
- Firmar compromissos com agentes de tratamento – Negociar acordos para resolver irregularidades e conflitos jurídicos.
- Editar normas e regulamentos para pequenas empresas – Preparar orientações e procedimentos simplificados e diferenciados, inclusive quanto aos prazos, para que microempresas e empresas de pequeno porte, bem como iniciativas empresariais de caráter incremental ou disruptivo que se autodeclararem startups ou empresas de inovação.
- Facilitar a proteção de dados para pessoas idosas – Garantir que o tratamento de dados de idosos seja efetuado de maneira simples, clara, acessível e adequada ao seu entendimento, nos termos do Estatuto da Pessoa Idosa.
- Tomar decisões administrativas – Deliberar, na esfera administrativa, em caráter terminativo, sobre a interpretação da LGPD, as suas competências e os casos omissos.
- Informar infrações penais – Comunicar às autoridades competentes as infrações penais das quais tiver conhecimento.
- Informar infrações administrativas – Comunicar aos órgãos de controle interno o descumprimento do disposto na LGPD por órgãos e entidades da administração pública federal.
- Integrar-se a outras agências reguladoras – Articular-se com as autoridades reguladoras públicas para exercer suas competências em setores específicos de atividades econômicas e governamentais sujeitas à regulação
- Receber reclamações – Implementar mecanismos simplificados para o registro de reclamações sobre o tratamento de dados pessoais em desconformidade com a LGPD.
A ANPD desempenha, como se você, um papel essencial na regulamentação e fiscalização da proteção de dados no Brasil, garantindo o equilíbrio entre inovação, privacidade e segurança jurídica.
Em março de 2021, o Conselho Diretor publicou o Regimento Interno da ANPD, que detalha melhor as competências da Autoridade.
Competências relacionadas à educação
O art. 62 da LGPD, já no capítulo de Disposições Finais e Transitórias, dispõe que a ANPD deve, juntamente ao Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), editar regulamentos específicos relacionados à educação.
O primeiro regulamento diz respeito ao acesso a dados tratados pela União para o cumprimento da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, mais especificamente ao seu art. 9º, § 2º, que dispõe que ao tratar da organização da educação nacional a União “terá acesso a todos os dados e informações necessários de todos os estabelecimentos e órgãos educacionais”.
O segundo regulamento trata de dados referentes ao Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), de que trata a Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004 .
O que é a ANPD: receitas e patrimônio da Autoridade
Assim como outras agências reguladoras, a ANPD conta com diversas fontes de receita para financiar suas atividades e garantir sua autonomia operacional. Além disso, seu patrimônio é constituído por bens e direitos adquiridos ao longo do tempo.
Receitas da ANPD
De acordo com o art. 55-L da LGPD, as receitas da ANPD provêm de diversas fontes, incluindo:
- Recursos do orçamento da União – A ANPD recebe dotações orçamentárias, créditos especiais e adicionais, além de transferências e repasses governamentais.
- Doações e subvenções – A ANPD pode receber recursos de doações, heranças (legados) e subvenções de entidades públicas e privadas.
- Venda e aluguel de bens – Caso possua bens móveis ou imóveis, a ANPD pode obter receita com sua venda ou locação.
- Aplicações financeiras – Os recursos disponíveis podem ser aplicados no mercado financeiro para gerar rendimentos.
- Parcerias e convênios – A ANPD pode obter recursos por meio de contratos, convênios e acordos com entidades nacionais e internacionais, sejam públicas ou privadas.
- Venda de materiais técnicos e informações – A comercialização de publicações, materiais técnicos e dados pode gerar receita para a ANPD.
Curioso notar que o inciso VI do art. 55-L dispõe expressamente que a ANPD pode obter receita vendendo “dados e informações”…
Patrimônio da ANPD
O artigo 55-M estabelece que o patrimônio da ANPD é composto por:
- Bens e direitos transferidos pelos órgãos da Presidência da República – A estrutura inicial da ANPD foi formada por recursos transferidos do governo federal, especialmente quando a Autoridade ainda não possuía a natureza jurídica de autarquia especial.
- Bens e direitos adquiridos ou incorporados – A ANPD pode expandir seu patrimônio por meio da aquisição de bens ou incorporação de novos ativos ao longo de suas operações.
Essas fontes de receita e patrimônio garantem que a ANPD tenha os meios necessários para cumprir seu papel de regulamentação e fiscalização da proteção de dados no Brasil.
Conclusão
Neste artigo, vimos a resposta para a pergunta “o que é a ANPD?”.
Em resumo, a ANPD desempenha um papel fundamental na proteção de dados pessoais no Brasil, garantindo que a LGPD seja aplicada de maneira eficaz e equilibrada.
Sua estrutura, suas amplas competências e seu Regimento Interno consolidam sua atuação como órgão regulador e fiscalizador, promovendo segurança jurídica para empresas e maior controle para os titulares dos dados.
Embora ainda longe do ideal, a Autoridade tem evoluído desde a sua criação para atender às demandas do cenário digital, buscando harmonizar inovação e privacidade. A conquista de sua autonomia administrativa reforça sua importância e confere maior independência para o cumprimento de suas atribuições.
Com o avanço das tecnologias e o crescimento do volume de dados processados, a atuação da ANPD será cada vez mais relevante.
Assim, compreender seu funcionamento é essencial para empresas, profissionais do Direito e cidadãos que desejam garantir a conformidade com a LGPD e proteger suas informações pessoais.